O reconhecimento pessoal, em si mesmo, representa uma infinitude de questionamentos, sobretudo em termos de psicologia forense. Costuma-se tripartir em fases a formação do testemunho, também aplicável ao reconhecimento de pessoas, seja pela vítima ou por testemunha ocular do fato delituoso: (i) o conhecimento do fato; (ii) a conservação do conhecimento; e (iii) a declaração do conhecimento (cf. AQUINO, José Carlos G. Xavier. A prova testemunhal no processo penal brasileiro, 5ª ed., São Paulo: Letras Jurídicas, 2015, p. 55).
Nessa sequência, não é incomum a formação de falsas memórias, ou a perda delas, sobretudo em se tratando de vítimas de crimes violentos, dado o trauma que a vem acometer. Nem por isso, no entanto, deixa-se de fazer um reconhecimento absolutamente positivo de indivíduos, normalmente presos e apresentados à vítima ou à testemunha como sendo o verdadeiro autor do crime.
Em tempos atuais, o reconhecimento pessoal não enfrenta apenas as questões que lhe são próprias. O desrespeito aos mecanismos processuais, criados exatamente para mitigar as dificuldades naturais desse meio de prova, leva a um desvalor que em muitos casos deveria torná-lo imprestável para subsidiar uma prisão cautelar, a denúncia e a sentença condenatória.
Ao arrepio do regramento processual, procede-se ao reconhecimento pessoal muitas vezes sem se observar quaisquer das disposições elencadas entre os artigos 226 e 228 do Código de Processo Penal, cuja transcrição é valiosa para sua difusão:
Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma: I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida; Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la; III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela; IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais. Parágrafo único. O disposto no no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento. Art. 227. No reconhecimento de objeto, proceder-se-á com as cautelas estabelecidas no artigo anterior, no que for aplicável. Art. 228. Se várias forem as pessoas chamadas a efetuar o reconhecimento de pessoa ou de objeto, cada uma fará a prova em separado, evitando-se qualquer comunicação entre elas.
Sobre o assunto, é extremamente simbólico o artigo publicado hoje pelo ConJur e ora compartilhado, que, além da utilidade prática e acadêmica, foi escrito por dois delegados de polícia: Leonardo Marcondes Machado é delegado da Polícia Civil de Santa Catarina, mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e especialista em Direito Penal e Criminologia; Raphael Jorge de Castilho Barilli é delegado da Polícia Civil do Rio de Janeiro, mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pós-graduado em Direito Público pela Universidade Candido Mendes (Ucam).
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